ODS 1
A sustentabilidade é um luxo

Em tempos de crise, aluguel de produtos de grife volta a ficar em alta


Convidada para uma festa de casamento, na qual o dress code exigia um gasto con$iderável, a universitária carioca Alexia Chlamtac, 22 anos, foi tomada por uma tentação consumista. O vestido, ela já tinha, mas seria a hora de, enfim, comprar o seu objeto do desejo há tempos: uma clutch PS11, da grife americana Proenza Schouler, que custa a bagatela de quase US$ 2 mil. Num site com entrega no Brasil, o item chegava à cifra de R$ 10 mil… A moça balançou, mas decidiu recorrer a um plano B, que descobrira num blog de moda: visitar pela primeira vez um site de aluguel de bolsas de luxo, onde adquiriu a desejada clutch, por uma semana, desembolsando módicos R$ 132. A moça garante que arrasou duplamente, pois usou a peça desejada e ainda economizou uma pequena fortuna, ainda mais num momento em que o dólar vive atingindo cotação estratosférica.
– Não é uma questão de praticidade apenas, é de consciência mesmo. Eu poderia comprar a bolsa, mas, após o casamento, ficaria no armário, sem uso. Descobri que ela era muito melhor do que eu imaginava, mas que não tinha coerência na minha rotina. Acho o aluguel divertido porque são mais opções no guarda-roupa. Você tem a possibilidade de variar sem ter que investir uma grana e sem acumular coisas. Se compramos tudo o que queremos, acabamos acumulando muito, desnecessariamente – afirma a jovem consumidora, que voltou a experimentar o site uma segunda vez.
[g1_quote author_name=”Alexia Chlamtac” author_description=”Universitária” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Não me sinto mais tendo algo. Acho que o “ter” é super ultrapassado. Me tornei muito mais consciente nas minhas compras e muito mais desapegada.
[/g1_quote]De olho nessa clientela frequentadora do setor do luxo, que (seja por questões financeiras ou decidida a praticar um consumo mais consciente) descobriu a prática do aluguel de roupas e acessórios, sites especializados nesse gênero de negócios começam a entrar com força no mercado e já comemoram os bons ventos. Alexia, por exemplo, recorreu ao site Bobags, administrado pela empresária Isabel Braga, que, em 2009, teve a ideia de botar à disposição para aluguel o seu acervo de bolsas de grife. No ano seguinte, ela já havia criado um blog para esse negócio. No início eram apenas de dez itens.- Eu já imaginava esse tipo de negócio como uma forma de praticar economia sustentável. E percebi, logo no início, a receptividade das clientes. Algumas alugavam as bolsas porque queriam exibi-las numa festa, mas outras já começam a entender a proposta da sustentabilidade: de usar algo num momento sem ter a posse definitiva. Esse é o futuro do consumo. As nossas casas vão diminuindo de tamanho e as pessoas se dão conta de que é preciso viver com mais leveza, o que significa ter menos para investir o dinheiro em outras coisas – acredita Isabel
A empresária foi para o Vale do Silício, nos Estados Unidos, onde fez uma série de cursos de “sharing economy”. Voltou para o Rio em 2014, disposta a alavancar a empreitada. Profissionalizou o site, criando o e-commerce, com um estoque de cem bolsas (peças novas e usadas que comprou no Brasil para aluguel), de pelo menos 20 grifes de alto luxo. Há ainda cem outras bolsas oferecidas para a venda.
O Bobags tem atualmente duas mil clientes que alugam peças com frequência. É possível adquirir modelos Chanel, Bottega Veneta, Chlóe, Gucci, Goyard, Prada, Balenciaga, Louis Vuitton… por preços que cabem no bolso. A cliente escolhe entre “possuir” o produto por um fim de semana, uma semana ou um mês, por preços que partem de R$ 60. Uma das mais desejadas são as bolsas Chanel, alugadas a partir de R$ 220 por uma semana. Uma peça nova semelhante, segundo Isabel, pode chegar à casa dos R$ 25 mil.
Recentemente, uma jovem cliente procurou Isabel para vender uma bolsa Céline, que havia herdado da avó, e recebeu R$ 5 mil pela peça. Ela usou, então, o dinheiro numa viagem a Nova York e, quando precisou, alugou a bolsa para ir a uma festa.
– É realmente um momento de repensar nossos hábitos. Essa cliente pesou e achou que não precisava ter a bolsa. Que poderia fazer um bom uso desse dinheiro para outras coisas. Agora, quando quer, ela aluga. Dá para alugar 30 bolsas diferentes durante quase 3 anos, tendo uma bolsa diferente todo mês em casa, pelo preço de uma. Essa prática permite uma extensão da vida útil das peças, ainda mais num país, como o nosso, fechado para o mercado de luxo, com impostos altíssimos – acrescenta Isabel, contando ainda que uma cliente do Nordeste aluga mensalmente uma bolsa de luxo diferente.
Gostando do conteúdo? Nossas notícias também podem chegar no seu e-mail.
Veja o que já enviamosPara evitar problemas, as transações de aluguel são feitas de forma cuidadosa. As clientes são cadastradas, há pagamento de caução e um tipo de contrato para a garantia de que a peça será devolvida sem danos. Caso contrário, haverá ressarcimento. O site divulga todas as informações detalhadamente sobre isso. O motivo pelo qual a cliente aluga uma bolsa, acredita a empresária, não importa, o fato é que essa prática torna possível o sonho de usar uma bolsa de grife para um número maior de mulheres.
Animada com o faturamento, que não divulga, Isabel conseguiu, recentemente, um investidor que a ajudará a alavancar ainda mais o negócio:
– Até o fim do ano, aumentaremos o nosso estoque de aluguel para 500 bolsas – adianta ela, sem dar mais detalhes.

Quem também decidiu se aventurar nesse mundo da economia colaborativa foi a empresária Flávia Sampaio, mulher do também empresário Eike Batista. Ela criou, há seis meses, o site PowerLook, colocando para aluguel cerca de 300 vestidos de festa e acessórios novos, de algumas das melhores grifes nacionais e estrangeiras. Segundo Flávia, a iniciativa vai ao encontro da necessidade das pessoas e da atual situação do país.
– O PowerLook é democrático e vai além de uma loja de aluguel de vestido de festa. Somos uma empresa que pensa consciente e isso é ser fashion hoje em dia. É voltado para quem quer entrar na moda e, ao mesmo tempo, com consciência – conta Flávia, que, diante da receptividade da clientela, inaugurou recentemente sua primeira loja física, em Ipanema, onde também oferecerá o mesmo serviço.
A clientela, de acordo com Flávia, é eclética. Sem revelar o total de mulheres cadastradas, a empresária conta que, nesses primeiros seis meses de vida, o site já alugou vestidos mais de mil vezes:
– Como temos vestidos para diferentes estilos e ocasiões, a faixa etária da clientela também é bem abrangente. A procura vai desde as mães de noiva até os bailes de debutante.
Christian Dior, Dolce & Gabbana, Emilio Pucci, Moschino e as nacionais Cris Barros e Animale são algumas das etiquetas disponíveis pelo aluguel diário da Power Look, que parte de R$ 180. Para fazer a transação, o site explica o passo-a-passo para as clientes, que assinam um termo de responsabilidade em relação ao uso, cuidados e prazos de entrega.
A consumidora Alexia Chlamtac, que descobriu o aluguel de bolsas, promete continuar a se aventurar por esse novo conceito de consumo:
– Não me sinto mais tendo algo. Acho que o “ter” é super ultrapassado. Depois do BoBags e de muita leitura sobre o assunto, me tornei muito mais consciente nas minhas compras e muito mais desapegada. Com frequência, coloco as minhas roupas à venda para ganhar um dinheiro a mais e fazer a energia circular. Não quero ficar acumulando desnecessariamente.
Últimas do #Colabora

Depois de duas décadas dedicadas à cobertura da vida cotidiana do Rio de Janeiro, a jornalista Laura Antunes não esconde sua preferência pelos temas de comportamento e mobilidade urbana. Ela circula pela cidade sempre com o olhar atento em busca de curiosidades, novas tendências e personagens interessantes. Laura é formada pela UFRJ.
Adorei a matéria.
Sou cliente da Bobags e acho alugar muito mais elegante do que ter.
Achei interessante.